domingo, 7 de outubro de 2012

Clubes Negros e Imprensa Negra


CLUBES NEGROS E IMPRENSA NEGRA: ELO SOCIAL PARA A MOBILIDADE AFRO-GAÚCHA
Sátira Machado, jornalista

No Brasil,  enquanto plantavam, colhiam, engomavam e curavam os  descendentes de  africanos/as  incluíram
vários elementos da cultura negra no dia-a-dia dos brasileiros. Reagiram de várias formas às más condições de vida e
usavam a jinga da capoeira para se defender e o toque do tambor para se comunicar (JANHEINZ, 1963).  Nesse
exercício, num primeiro momento, era a tradição oral a responsável pela transmissão de valores, de mitos, de enigmas,
de fórmulas e demais criações dos vários grupos étnicos advindos do continente africano, que ao longo das gerações
vem recriando a cultura afro-brasileira. Num segundo momento, a Imprensa Negra passou a cumprir um importante
papel  no registro da historiografia  das e dos  afrodescendentes,  uma vez que  os meios de comunicação eram e são
incluídos nos processos de socialização dos Clubes Sociais Negros.
No Rio Grande do Sul, a Imprensa Negra é legitimada com periódicos como: O Exemplo (Porto Alegre, 1892-
1930), A Cruzada (Pelotas, 1905), A Navalha (Santana do Livramento, 1931), A Revolta (Bagé,1925), A Hora (Rio
Grande, 1917-1934), A Alvorada (Pelotas, 1907- 1910; 1930 – 1937; 1946 – 1957), O Ébano (1962). (SANTOS, 2003).
Na  década de 70,  foi lançada a revista gaúcha  Tição
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, publicação que tinha como principal pauta o debate sobre a
discriminação racial no Brasil. Em 1987, o Centro Ecumênico de Cultura Negra (Cecune) passou a executar projetos
sociais, principalmente de cunho comunicacional, promovendo mostras de cinema e vídeo  com a temática negra, em
Porto Alegre.  O Cecune promoveu ainda a edição do Jornal Como é (1995 – 1998), a publicação da Revista Conexão
Negra (2003) e, atualmente, mantém o website Nação Z.
TIÇÃO COMO É CONEXÃO NEGRA JORNAL DE
IMPRENSA NEGRA
Muitos desses informativos foram produzidos por negras e negros ligados aos clubes negros, como a sociedade
Floresta Aurora,  a  associação  Satélite Prontidão, o Clube Fica Ahi Pra ir Dizendo,  entre outros. Os Clubes Sociais
Negros
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são  espaços de resistência cultural criados para fazer frente à proibição da entrada  de negros/as em clubes
sociais das elites  não-negras  brasileiras.  Nesses clubes próprios, os homens e as mulheres  negras empreendiam
atividades estratégicas de socialização para a garantia da mobilidade social dos afro-brasileiros, principalmente voltadas
à instrução/educação da comunidade negra. O jornal A Alvorada (Pelotas/RS) foi um dos periódicos com mais tempo de
circulação na história da Imprensa Negra brasileira. Estreitamente ligado ao Clube Fica Ahi Pra ir Dizendo, de Pelotas,
noticiou o cotidiano de uma elite negra urbana, formada por operários no período pós-abolição do Rio Grande do Sul.
FRENTE NEGRA
BRASILEIRA
A VOZ DA RAÇA  O EXEMPLO A ALVORADA
Em  São Paulo, a Frente Negra Brasileira (FNB)  mantinha o jornal  A Voz da Raça cujo lema era:  A
emancipação dos negros tem que ser obra dos próprios negros. Criada em 1931, a FNB foi o primeiro e único partido
político negro da história do Brasil. O partido foi desmontado pela ditadura do Estado Novo em 1937
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. Intensificando a
representação política da comunidade negra gaúcha, a Frente Negra Pelotense (FNP) foi fundada em 1933. Muitos dos
propósitos da FNP foram fortalecidos nos diálogos com a Frente Negra Brasileira (FNB), através do jornal A Alvorada.
(SANTOS, 2003).
Na história da Imprensa Negra brasileira registra-se ainda a preocupação com a cidadania educativa dos afrobrasileiros, como pontua Jacira Reis da Silva (2001). Ela  estudou as mulheres negras e sua participação na luta por
educação através do jornal  A Alvorada. A pesquisadora  ressaltou  o papel alternativo desse periódico na formação
                                               
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No formato revista entre 1978 e 1979, tornando-se jornal em 1980.
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No RS, existem mais de 50 Clubes Sociais Negros que eram sociedades ou associações recreativas, educativas e culturais – algumas centenárias,
outras extintas. Ver dissertação Clubes Sociais Negros: lugares de memória, resistência negra, patrimônio e potencial de Giane Vargas Escobar,
defendida na Universidade Federal de Santa Maria/RS.
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www,portalafro.com.brcultural e educacional das comunidades negras, bem como a presença marcante das mulheres na Imprensa Negra
Pelotense em períodos históricos onde o espaço público era predominantemente ocupado por homens brancos.
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Desde então, valendo-se de jornais, de programas de televisão, de filmes, de rádios comunitárias, de revistas,
de vídeos, entre outros meios de comunicação, os/as afrodescendentes usam a mídia para divulgar vários aspectos das
comunidades negras do Brasil e do mundo. A popularização dos preços dos computadores, a expansão da telefonia e o
incremento das políticas públicas de inclusão digital abriram caminho para  a maior circulação de conteúdos  gerados
pelos movimentos sociais negros
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. Exemplo vivo  são as  informações  do movimento clubista negro disponíveis no
“Portal para os Clubes Sociais Negros do Brasil”, um projeto do Museu Treze de Maio do RS, proveniente do Clube
Afro-Ferroviário Treze de Maio da cidade de Santa Maria, que completa 108 anos de existência e resistência em 2011.

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