sexta-feira, 12 de novembro de 2010

Infância, Família e Escola

INFÂNCIA, FAMÍLIA E ESCOLA SEGUNDO PHILIPPE ARRIÈS

A infância foi construída a partir da visão dos adultos sobre as crianças, o que fazia com que crianças, a partir de uns sete anos, e adultos, não fossem distinguidos. Assim que a criança não dependesse mais da ama de leite, e que já estivesse crescida, ela deveria abandonar os seus brinquedos e jogos (cortar papel com tesoura, música, alfabetização, regras de etiqueta e moralidade, bonecos, cartas, xadrez), se vestir como os adultos, e passar a se comportar como eles. E desta forma, deixar a infância de lado. E se a criança ainda era muito pequena, era ignorada por todos. O ser humano só passava a existir quando se misturava com os adultos. Todas as crianças, a partir dos sete anos de idade, independente de sua condição social, eram inseridas em famílias estranhas para aprenderem serviços domésticos. Os trabalhos domésticos não eram considerados degradantes e constituíam uma forma comum de educação tanto para os ricos como para os pobres.

Ariès utiliza a iconografia (uma forma de linguagem visual que utiliza figuras para relacionar alguns temas) para falar de infância e família. A iconografia tradicional dos doze meses do ano foi criada no século XII: os trabalhos, os dias e as estações. No século XVI, essa iconografia dos meses sofreu uma transformação significativa, e assim, traz a família, combinando-se com os símbolos de uma alegoria tradicional: as idades da vida. As formas de representação eram a criança, o casal e o idoso. O aparecimento do tema ‘família’ não foi um simples episódio, mas uma evolução durante os séculos XVI e XVII. O sentimento da família é inseparável do sentimento da infância. Surgiram então os Tratados Práticos de Educação: conselhos aos pais sobre como educar seus filhos. A educação não é mais voltada para as boas maneiras, é importante a escolha de uma escola e um ofício. O objetivo era instruir a própria família sobre seus deveres e suas responsabilidades, e aconselhá-la em sua conduta com relação às crianças.

A escola na Idade Média era reservada a apenas a um pequeno número de sacerdotes de diferentes idades. Era comum haver adultos e, até mesmo idosos, junto com crianças pequenas formando uma só turma. Houve o uso de autoritarismo para separar as crianças da sociedade dos adultos. Resistências a essa evolução persistiram por longo tempo. De asilos, as escolas passam a institutos de ensino, submetendo os alunos a uma disciplina autoritarista. Essa mudança fornece o modelo para a complexa instituição que se tornou o colégio moderno misturando ensino, vigilância e enquadramento da juventude. Esse processo está conectado à nova percepção das idades e da infância. A partir de 1763, o regime disciplinar escolástico passa a ser rejeitado e os castigos corporais não são mais aplicados à infância. O investimento passa a ser no despertar do adulto contido na criança, buscando o sentido de sua dignidade.

INFÂNCIA, FAMÍLIA E ESCOLA SEGUNDO GILBERTO FREYRE:

As crianças eram vistas como mini-adultos, deveriam vestir, desde uns nove anos, calças pretas e se comportar como adultos, andar de forma grave com gestos sisudos e ar tristonho. Até uns cinco anos de idade as crianças andavam nuas como os moleques da senzala, e assim não era possível distingui-los. As crianças brancas, criadas pelas iaiás, tiveram que lidar com alguns tormentos. Para tomarem ar de europeus, os barões e viscondes do Império deixavam que seu filho judiasse de moleques e negrinhas, mas na sociedade dos mais velhos o judiado era ele. Nos dias de festa devia apresentar-se de roupa de homem, e duro, correto, sem machucar o terno preto em brinquedo de criança. Ao pai devia chamar “senhor pai” e à mãe “senhora mãe”: a liberdade de chamar “papai” e “mamãe” era só na primeira infância. Até então, esposas e filhos se encontravam quase no mesmo nível dos escravos. Somente depois de casado o filho arriscava-se a fumar na presença do pai; e fazer a primeira barba era cerimônia da qual o rapaz necessitava sempre de licença especial. Licença sempre difícil, e só obtida quando o buço e a penugem da barba não admitiam mais demora.

O português costumava usar o homem para o trabalho e para a guerra, principalmente na conquista de novos territórios, e a mulher servia para formar a família. Esse contato provocava o desequilíbrio das relações do índio com o seu meio ambiente. A escravidão desenraizava o negro de seu meio social e desfazia seus laços familiares. Além dos trabalhos forçados, ele era usado como reprodutor de escravos: era necessário aumentar o número de escravos para o senhor de engenho. As crias nascidas eram logo batizadas e ainda assim consideradas gente sem alma. Os senhores de engenho casavam-se várias vezes, sempre preferindo as jovens sobrinhas; o sentimento da propriedade privada era exagerado. As heranças eram disputadas por filhos legítimos e parentes próximos. Aos filhos bastardos, gerados nas casas-grandes e paridos na senzala, restava a tolerância do senhor, que ao morrer os libertava.

Até meados do século XIX, o costume dos meninos de engenho foi o de fazerem os estudos em casa com capelão ou mestre particular. O mestre era um senhor todo-poderoso. Do alto de sua cadeira, que depois da Independência tornou-se uma cadeira quase de rei, com a coroa imperial esculpida em relevo no espaldar, distribuía castigos com o ar terrível de um senhor de engenho castigando negros fujões. Ao vadio punha de braços abertos; ao que fosse surpreendido dando uma risada alta, humilhava com o chapéu de palhaço para servir de deboche da escola inteira; a um terceiro, botava de joelhos sobre grãos de milho. Isto sem falar da palmatória e da vara – esta, muitas vezes com um espinho ou um alfinete na ponta, permitindo ao professor furar de longe a barriga da perna do aluno.

Quanto à caligrafia cabe destacar que o mestre gastava horas e horas aperfeiçoando os bicos das penas de ganso, e depois disso, iniciava-se a tortura – o menino com a cabeça para o lado, a ponta da língua de fora, em uma atitude de quem se esforça para chegar à perfeição; o mestre, de lado, atento à primeira letra gótica que saísse torta. Um errinho, qualquer - e eram bordoadas nos dedos, beliscões pelo corpo ou puxões de orelha. Outro estudo sagrado foi o de latim. Quanto à soletração, aprendia-se “em uma balburdia enfadonha”, diz-nos o padre Sequeira. Soletrando-se tudo alto.

Depois da independência, começaram a surgir colégios particulares, onde os filhos de magistrados e de funcionários públicos e senhores de engenho passaram a estudar. Imagine a saudade com que os meninos de engenho, acostumados a uma vida toda de vadiação – banho de rio, arapuca de apanhar passarinho, briga de galo, chamego com as primas e negrinhas – deixavam essas delícias para virem, de barcaça ou cavalo, estudar nos internatos; ou mesmo nos externatos – neste caso hospedando-se em casa dos comissários de açúcar ou café.

(Texto criado por Nathália Seibt, estudante do 1º semestre de Pedagogia)

Nenhum comentário:

Postar um comentário